18 fevereiro 2006

Perder e ganhar

Perder e ganhar. Falta e completude. Perder para depois ganhar, receber para o conseguinte desperdício. Algumas anedotas sobre o homem oriental (esse grande 'outro' do ocidente) dizem respeito a que, quando as coisas começam a melhorar, é motivo de tristeza, já que uma nova queda se anuncia. Dentro desses jogos de ganhar e perder, de desejo e falta, de completude e obsolescência, o homem 'normal' constitui todo seu espaço. É assim que trabalha, e junto com o 'ganho' do trabalho, recebe um salário que não é digno de seus esforços, e uma série de ritos onde alguns são mais suficientes que outros, alguns melhores são menos completos que outros aduladores, e assim por diante. É assim que ama, sob a constante ameaça da frustração, o medo da infidelidade, a insegurança sobre seu próprio desempenho físico, as constantes deformidades corporais e os grandes sacrifícios da saúde por uma fugaz beleza vendida. E é assim que vive, sempre num jogo de arriscar a tudo, em outro jogo de desejar tudo aquilo a que não possui, e em outro onde o que possui torna-se obsoleto e só adquire valor após a perda. Se possui, é obsoleto, se não tem, deve desejá-lo, se é inferior, deve sobrepujar ao outro, e se é superior, deve subjugar a todos.

É dentro desse movimento de autoritarismo e permissividade, de desejo e falta, de ganho e perda, ou seja, sempre dentro de uma relação com a vida essencialmente instável e negativa que nosso 'homem' constitui seu espaço. É numa constante negação de sua situação que o homem busca movimento, ao invés de uma afirmação do que se é para se ir além. Ainda parecem ser o ressentimento, o arrependimento e a mesquinhez os móveis da existência, já que, ao invés de uma superação de sua própria situação, o que se busca é sempre o negativo do que se é. É em função da bela modelo que usa os cosméticos da 'moda', do possuidor de bens, dos modos de vida fúteis, que se colocam os referenciais. Sempre o ressentimento em relação a si e ao outro, ao invés da afirmação de uma existência singular, que por sua singularidade, empurra-se sempre para além de si mesma, sempre para a superação de si mesma. Deixamos de lado a superação, para o advento desse jogo de perda e ganho (esse jogo de desejo e falta), onde existimos apenas contemplando um pequeno horizonte de possibilidades, que se encerram em modos de vida cuja 'autenticidade' é de antemão visada, em comportamentos cuja espontaneidade é prevista e catalogada, em mediocridades e intrigas pessoais que não levam a lugar algum, e existem apenas para ocupar o tempo.

Constituímos nossa existência de um modo essencialmente reativo e ressentido. Veja-se, nossa existência, essa pequenina existência que se apaga num pequeno suspiro e que começa num gesto essencialmente singular, encerrada em tudo aquilo que mata sua própria singularidade. Escolhe essa pequena existência ser apenas uma bolha que se insinua no lodo. Quando será uma estrela que nasce de uma explosão, e com outra se apaga?

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